Jardim dos musgos em Hakone
Estive pela primeira vez no Japão em 1982. Suspeitei a diferença, quando, ainda menina, fui assistir a Madame Butterfly com minha mãe. Saí jurando que nunca iria ao Japão. A angústia da personagem, a impossibilidade, o desespero do sentido, ou da falta dele, me levaram à convicção de que nunca pisaria em solo japonês. Pois é, foi o primeiro pais do mundo que visitei. Rota: EUA, Alaska (outro jurado por mim, que sou alérgica a frio) e Narita.
Cheguei ao Japão do mesmo jeito que cheguei à opera, meio sem saber o que estava fazendo ali. A sensação era confusa. Às vezes sentia tonteira diante de letreiros com caracteres que não era capaz de decifrar, às vezes medo. Um desconforto completo diante do meu analfabetismo. Falar, sabia: Hajime machitê, arigatô, ohaiô, mizu kudassai..., coisinhas mínimas para não morrer de sede e de vergonha. Conheci pessoas de uma delicadeza tão grande, que eu ficava meio sem saber o que fazer com elas. Em Tóquio, fiquei hospedada na casa de uma família fantástica. O código comum era o inglês: o meu, que nunca foi grande coisa, e o deles, que não era lá essa maravilha. Funcionou, embora eu, por limitações lingüísticas de nosso japinglês, quase tenha escovado os dentes no honorável sanitário do dono da casa. Nunca havia entrado em um banheiro oriental típico.
Depois de algum tempo, lá fui eu para Hokkaido, onde conheci pessoas incríveis e fiz amigos. Viajei ainda por Kyoto, Atami, Hakone e Yokohama. Lugares indescritíveis, que foram capazes de me fazer perder um certo pavor oculto que tinha do Japão, mesmo com o terremoto de 4.5 na escala Richter que encarei em Tóquio e que foi a maior sensação de desamparo que já senti na vida. Estava sozinha, do outro lado do mundo, com aquele tremor e ruido da terra. Nunca tinha estado em um terremoto. O corpo treme como o chão (cá para nós não sei se de medo ou se é assim mesmo) e um ruido estranho, meio arquetípico, mobiliza todos os sentidos. Estado de alerta máximo. O corpo responde assim. Ainda bem que era no último dia da viagem. Na volta, enquanto sobrevoava a Amazônia, meu único pensamento era: o avião já pode cair. Estou em território nacional. Tolinha, se caísse mesmo, era mais fácil ser achada no Japão.
Três anos depois, em 1985, por vontade de dar corpo e voz à miscigenação brasileira, comecei a fazer poemas sobre as várias etnias que contribuíram para nossa formação cultural. Surgia o Brasileirinho, que, pela complexidade do projeto para a época, acabou engavetado até 2000, ano em que foi lançado. Nele há um poema que fiz para o Japão. Esse Japão que conheci com meu olhar brasileiro. A música, fiz a partir da minha observação do teatro Nô, que assití lá, e da percepção do instrumental utilizado na música típica japonesa, buscando a leveza observável na dança do leque. Mas acho que o sentimento mais forte foi o de gratidão e carinho pelo povo, que se materializou no muito que aprendi na convivência com eles e principalmente com a filosofia de Mokiti Okada. Foi com ele que aprendi conceitos como: teoria do efeito contrário, leis cósmicas, agricultura natural, desapego e izunomê, que me esforço para colocar em prática, o que não é fácil e nem sempre consigo.
Ano passado, retornei ao Japão com outro espírito. Fui sabendo o que estava fazendo e por que estava fazendo. Conheci mais pessoas e pude mergulhar mais e mais na delicadeza dessa cultura tão especial. Conheci Keiko, uma japonesinha a quem apelidei de "Meishu-Sama's Angel", que me recebeu em Kioto e que virou nome de uma personagem no meu livro O Sapo e o Pássaro, que conta a história do pássaro Tsuru Sam, e que vai ser lançado pela Ed. Larousse na Bienal de São Paulo. O passeio aos Solos Sagrados de Kioto, Atami e Hakone, com sua beleza natural, seus museus de arte com obras raríssimas, são imperdíveis para quem vai ao Japão. Visitei uma escola em Assakussa e fiquei apaixonada pelas crianças. Há um pequeno video que fiz delas, numa postagem mais antiga aqui no blog. O contraste entre o Japão tradicional e o moderno é uma história à parte. Nossa! está me batendo uma saudade tão grande... acho que já é hora de planejar minha volta.
Bem, segue abaixo o poema que fiz para o Japão e que está no livro infantil Brasileirinho - história de amor do Brasil, Ed. DCL, no qual há um CD com as músicas. É minha modesta homenagem ao povo do Sol Nascente.
Cheguei ao Japão do mesmo jeito que cheguei à opera, meio sem saber o que estava fazendo ali. A sensação era confusa. Às vezes sentia tonteira diante de letreiros com caracteres que não era capaz de decifrar, às vezes medo. Um desconforto completo diante do meu analfabetismo. Falar, sabia: Hajime machitê, arigatô, ohaiô, mizu kudassai..., coisinhas mínimas para não morrer de sede e de vergonha. Conheci pessoas de uma delicadeza tão grande, que eu ficava meio sem saber o que fazer com elas. Em Tóquio, fiquei hospedada na casa de uma família fantástica. O código comum era o inglês: o meu, que nunca foi grande coisa, e o deles, que não era lá essa maravilha. Funcionou, embora eu, por limitações lingüísticas de nosso japinglês, quase tenha escovado os dentes no honorável sanitário do dono da casa. Nunca havia entrado em um banheiro oriental típico.
Depois de algum tempo, lá fui eu para Hokkaido, onde conheci pessoas incríveis e fiz amigos. Viajei ainda por Kyoto, Atami, Hakone e Yokohama. Lugares indescritíveis, que foram capazes de me fazer perder um certo pavor oculto que tinha do Japão, mesmo com o terremoto de 4.5 na escala Richter que encarei em Tóquio e que foi a maior sensação de desamparo que já senti na vida. Estava sozinha, do outro lado do mundo, com aquele tremor e ruido da terra. Nunca tinha estado em um terremoto. O corpo treme como o chão (cá para nós não sei se de medo ou se é assim mesmo) e um ruido estranho, meio arquetípico, mobiliza todos os sentidos. Estado de alerta máximo. O corpo responde assim. Ainda bem que era no último dia da viagem. Na volta, enquanto sobrevoava a Amazônia, meu único pensamento era: o avião já pode cair. Estou em território nacional. Tolinha, se caísse mesmo, era mais fácil ser achada no Japão.
Três anos depois, em 1985, por vontade de dar corpo e voz à miscigenação brasileira, comecei a fazer poemas sobre as várias etnias que contribuíram para nossa formação cultural. Surgia o Brasileirinho, que, pela complexidade do projeto para a época, acabou engavetado até 2000, ano em que foi lançado. Nele há um poema que fiz para o Japão. Esse Japão que conheci com meu olhar brasileiro. A música, fiz a partir da minha observação do teatro Nô, que assití lá, e da percepção do instrumental utilizado na música típica japonesa, buscando a leveza observável na dança do leque. Mas acho que o sentimento mais forte foi o de gratidão e carinho pelo povo, que se materializou no muito que aprendi na convivência com eles e principalmente com a filosofia de Mokiti Okada. Foi com ele que aprendi conceitos como: teoria do efeito contrário, leis cósmicas, agricultura natural, desapego e izunomê, que me esforço para colocar em prática, o que não é fácil e nem sempre consigo.
Ano passado, retornei ao Japão com outro espírito. Fui sabendo o que estava fazendo e por que estava fazendo. Conheci mais pessoas e pude mergulhar mais e mais na delicadeza dessa cultura tão especial. Conheci Keiko, uma japonesinha a quem apelidei de "Meishu-Sama's Angel", que me recebeu em Kioto e que virou nome de uma personagem no meu livro O Sapo e o Pássaro, que conta a história do pássaro Tsuru Sam, e que vai ser lançado pela Ed. Larousse na Bienal de São Paulo. O passeio aos Solos Sagrados de Kioto, Atami e Hakone, com sua beleza natural, seus museus de arte com obras raríssimas, são imperdíveis para quem vai ao Japão. Visitei uma escola em Assakussa e fiquei apaixonada pelas crianças. Há um pequeno video que fiz delas, numa postagem mais antiga aqui no blog. O contraste entre o Japão tradicional e o moderno é uma história à parte. Nossa! está me batendo uma saudade tão grande... acho que já é hora de planejar minha volta.
Bem, segue abaixo o poema que fiz para o Japão e que está no livro infantil Brasileirinho - história de amor do Brasil, Ed. DCL, no qual há um CD com as músicas. É minha modesta homenagem ao povo do Sol Nascente.
Bom dia, Japão
Raiou o dia! OHAIÔ!
O Sol do Oriente
Se faz presente
entre a gente do Brasil.
Traz os olhos bem rasgados
Traz um jeito delicado
E nas lutas campeão
No judô, no karatê
E na mente o que se vê
É a força do Japão.
Fala pouco, pensa muito,
Sente muito, mostra pouco
E parece sempre igual.
Meu querido japonês,
Por todo bem que nos fez,
ARIGATÔ do pessoal.