quinta-feira, 25 de março de 2010

Como formar leitores?

Reproduzo aqui parte de minha fala no Salão de Idéias da Bienal Internacional do Livro de São Paulo. O assunto do debate era a formação do leitor. Na ida pra lá fui pensando sobre o assunto e no hotel redigi o pequeno texto abaixo. Além de mim, participaram a Ana Maria Machado, a Marina Colasanti e o Bruno Lerner.

Sabemos que qualidade é fundamental na literatura e em toda e qualquer manifestação artística. No caso da literatura para jovens, qualidade implica ausência de didatismos, de ensinamentos, de lugares-comuns, de previsibilidade.
Faz parte ainda dessa qualidade levar o jovem leitor a refletir e a interpretar o mundo a sua volta. O escritor, como áugure, lê os sinais, mas é a competência com que os lê, interpreta, nomeia e estrutura através de um universo ficcional que define sua capacidade artística. Nisso consiste seu desafio.

Mas como fazer esse livro de qualidade ser desejado pelo estudante? Como tornar esse jovem um livrodependente? Acreditamos que o primeiro passo seja deixá-lo livre em suas escolhas. Aceitarmos sem ansiedade o seu gosto “duvidoso”, se esse for o caso, não nos arrepiarmos de pavor quando ele nos disser que sua leitura se limita a notícias sobre esportes nos jornais ou a manchetes funerárias. Aceitarmos sem julgar. Interessar-nos pelo que ele diz, deixando-o expressar seus sentimentos e idéias, tornando-nos seus parceiros e ouvintes. Abrir um canal de comunicação com esse aluno. Ir aos poucos mostrando a ele as obras que vemos como sendo de boa qualidade, não como donos da verdade e portadores de infalível gosto superior, mas com a humildade de quem demorou muito a chegar a esse estágio atual de vida e de leitura.

Tentarmos sinceramente colocar-nos no lugar dele, entendendo suas dificuldades, imaginando-nos com a idade dele, com um universo fragmentário de informações à volta, e muitas vezes sem condições de acesso ao livro, bombardeados pelas solicitações dos meios audiovisuais, a que se veio juntar recentemente a internet, atendidos (ou desatendidos) por um sistema educacional confuso, que em muitos aspectos reflete uma sociedade igualmente confusa. Sem falar no fato de que o jovem, dentro desse quadro, está ainda sem opinião formada sobre o mundo.

É natural que as escolhas dele não sejam as melhores. Contribuamos então com nossa paciência para que sejam provisórias, dividindo-nos com ele. Dessa forma o conquistaremos. Depois ofereçamos-lhe um livro atraente, sobre um tema que ele, jovem leitor, considere atraente, seja uma aventura espacial ou um livro de terror, de magia, de amor... não importa. O fundamental é a qualidade do texto oferecido.
Por essa qualidade, entenda-se a capacidade de levá-lo a observar e pensar o que antes não tinha percebido, a se emocionar, abrindo diante dele tantas possibilidades interpretativas, que se sinta provocado a descobrir novos sentidos.

Mas como os professores podem ser auxiliados nesse imenso desafio de formar leitores? Cremos que antes de tudo é preciso ouvi-los, mas mais que isso é preciso vê-los de perto, indo até a escola, observando suas dificuldades no dia-a-dia na sala de aula. Sem dúvida é uma tarefa hercúlea, mas não impossível. E continuar cada vez mais a oferecer-lhes bibliotecas, oficinas, cursos de reciclagem e, acima de tudo, livros.
Desse modo, acredito que possamos estar criando condições propícias para isolar e desenvolver o vírus EAL (eu amo ler), que uma vez inoculado contamina de forma irreversível.

terça-feira, 23 de março de 2010

Há futuro para a escrita?

No dia 5 de abril de 2010, segunda-feira, das 19h30 às 22h, no Memorial da América Latina - Biblioteca Latino-americana Victor Civita será lançado o livro A Escrita - Há futuro para a escrita? de Vilém Flusser. Na ocasião haverá a mesa-redonda "A ESCRITA DE FLUSSER", que contará com estudiosos como Gustavo Bernardo Krause (UERJ), Norval Baitello Jr. (PUC-SP), Pablo Gasparini (USP), Murilo Jardelino da Costa (UNINOVE – FASB).

Fundação Memorial da América Latina
Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664 - Portão 06
Metrô Barra - São Paulo - SP.
(11) 3823.4600 - http://www.memorial.sp.gov.br/

segunda-feira, 22 de março de 2010

Hoje é o dia mundial da água

Segundo a ONU, a cada ano morrem mais pessoas por doenças relacionadas a água contaminada do que por qualquer forma de violência, incluídas as guerras. Atualmente morrem 1,8 milhôes de crianças menores de cinco anos por esta causa, uma a cada 20 minutos. As vítimas dessas doenças ocupam a metade dos leitos dos hospitais de todo o mundo.
Quando poderemos comemorar o contrário?
Aconselho uma visita ao site da UNEP
http://www.unep.org/

sexta-feira, 19 de março de 2010

Revendo Kiriku

Vale relembrar um pouco deste ótimo trabalho de Michel Ocelot, que trouxe para a animação a lenda de Kiriku. Acho muito bom o fato de na versão original do filme, falado em francês, as vozes dos personagens serem feitas por atores africanos e nas músicas serem utilizados instrumentos como balafon, ritti, cora, xalam, tokho, sabaar e o belon, tradicionais da África.
Lembro que quando fizemos a gravação do CD do livro Brasileirinho - História de Amor do Brasil ocorreu algo semelhante. O Papete, que fez toda a percussão, levou para o estúdio instrumentos fantásticos, produto de suas pesquisas.
Na imagem abaixo, um xalam, instrumento tradicional africano.


Para quem não se lembra, a sinopse do filme é a seguinte:

¨Na África Ocidental, nasce um menino minúsculo, cujo tamanho não alcança nem o joelho de um adulto, que tem um destino: enfrentar a poderosa e malvada feiticeira Karabá, que secou a fonte d'água da aldeia de Kiriku, engoliu todos os homens que foram enfrentá-la e ainda pegou todo o ouro que tinham. Para isso, Kiriku enfrenta muitos perigos e se aventura por lugares onde somente pessoas pequeninas poderiam entrar.¨
O filme é legendado.



quinta-feira, 18 de março de 2010

A vida secreta de Merlim

A Heloisa Prieto convida para o lançamento de seu novo livro.

Clique no convite

quinta-feira, 11 de março de 2010

sábado, 6 de março de 2010

PhoneBook

Com criatividade os japoneses conseguiram esta bela união.


terça-feira, 2 de março de 2010

Já em casa!

Hoje falei com alguns dos amigos que chegaram de madrugada ao Brasil. Estão cansados, mas bem. É uma alegria ver todos de volta.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Amigos no terremoto do Chile

Meu primeiro sentimento diante da notícia de terremoto no Chile foi de espanto, profunda tristeza e déjà-vu. No dia anterior à partida de meu editor e amigo Sérgio Alves (Ed. Larousse), lamentei com ele meu total esquecimento do Congresso Ibero-americano de Literatura Infantil, de que pretendia participar. Não é comum que eu me desligue tanto das coisas assim, por isso fiquei bastante chateada. Como não havia mais nada que pudesse ser feito, combinamos a Feira de Bologna, agora em março. Assim que soube da notícia, tentei falar com ele e com outros amigos que foram para o evento. Não consegui. Recebi notícias deles de diversas fontes. Estão bem, dentro das possibilidades. A Ângela Lago está doente, segundo o Peter O.Sagae, mas medicada. A comunicação é quase impossível.

Veio forte em minha mente o desespero que passei na primeira vez que fui ao Japão, em 1982. Tinha ido participar de um congresso de jovens e, na véspera do retorno ao Brasil, houve um terremoto. Nunca em minha vida havia sentido tão completa impotência diante do desconhecido. Estava sozinha, longe de minha família e do meu país, no 35. andar de um hotel em Tóquio, quando começou o terremoto. Arrumava minhas malas, pois retornaria ao Brasil no outro dia pela manhã, quando o prédio começou a sacudir e a estalar e os objetos a sair do lugar e cair. Entrei em pânico e saí descalça para o corredor, sem saber o que fazer, enquanto luzes vermelhas se acendiam. Num inglês/japonês, que mal compreendia, avisavam que não entrássemos em pânico que o hotel estava preparado para essas situações. Ele podia até estar, mas eu não. Até hoje não lembro como fui parar no térreo ao lado de pessoas enroladas em toalhas, outras de pijamas, yukatas etc. A coisa que mais me impressionou foi o barulho, que parecia vir do centro da terra. Outros tremores menores aconteceram após algum tempo. Fui até o bar do hotel e pedi saquê. Bebi até criar coragem de voltar para o quarto. Não houve vítimas no Japão, apenas prejuízos materiais inevitáveis. No outro dia, voltei para o Brasil. Lembro o pensamento sombrio que fiz quando sobrevoamos a Amazônia: já posso morrer, estou em casa.
Penso que uma das grandes coisas que o sofrimento nos dá é a possibilidade de potencializar nosso senso de humanidade, qualificando-nos como pessoas. Olhando desse viés, é que consigo abrir espaço para a gratidão. Estou aqui aguardando a chegada de meus amigos, que, tenho certeza, virão maiores do que quando partiram.
Reproduzo o depoimento que a Ana Maria deu para a Folha de São Paulo sobre os momentos que passaram e ainda passam no Chile.

ANA MARIA MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM SANTIAGO

Espanto e medo, as duas primeiras sensações. Ainda dormindo, sinto a cama balançar, deslizar e trepidar enquanto algo me sacudia como num pesadelo. Ao abrir os olhos, no escuro, sem entender o que estava acontecendo, de repente me ocorre que, se tudo esta tremendo assim, deve ser um terremoto. Entrava uma fresta de luz por baixo da porta, fui até lá e abri.
A essa altura, tudo já sacudia muito forte. Barulho de vidros quebrados e coisas caindo, estalos dentro das paredes. Do outro lado do corredor, Jorge Eslava, escritor peruano e companheiro do mesmo congresso, segura-se no umbral de sua porta, me chama pelo nome e me diz: "Este é dos fortes..."
Pergunto-lhe: "Que faço?" "Isso mesmo que estas fazendo. Fica aí. Assim que parar, descemos. Teu sapato está por perto? Se estiver, pega antes de descer para não se cortar se tiver vidro quebrado no chão."
Quando o tremor diminui, sigo as instruções e ainda pego um casaquinho que estava a mão. Pelas escadas vamos encontrando outros hóspedes descendo. Reboco caído pelo chão, teto de gesso despencado, papel de parede solto, quadros e abajures derrubados. No saguão do hotel, funcionários nos instruem a sair e esperar lá fora. Longe do prédio para não sermos atingidos por algo que despenque. Procuro os amigos no meio da pequena multidão.
Vejo Marisa enrolada no lençol. Ambas assustadas, nos abraçamos. Os outros vão chegando, igualmente com medo e querendo abraços. Beth, Lygia, Dolores, Yolanda, Sylvia, Daniel, Antonio, Sérgio, Tania, Susana, Angela. Conferimo-nos mutuamente. Muita confusão. A rua toda escura, só o gerador do hotel com suas luzes de emergência. Carros saem com faróis acesos dos estacionamentos subterrâneos, todos se afastam para deixar que escapem para longe. Pelo asfalto, veículos passam muito rápido.
Parece que todos os cachorros do mundo latem ao mesmo tempo. Sirenes de bombeiros, ambulâncias. Barulho de batidas de automóveis. Mais outra em seguida. E mais outra. Claro: todos fogem e os sinais não funcionam.
Ficamos ali em pé, em roupa de dormir. Um ou outro chegou a se vestir completamente antes de descer. Os funcionários do hotel servem água. A equipe de acolhimento do congresso nos acalma, conversa, dá instruções. Entre elas, daí a umas duas horas, nos dizem para entrar. Insistem. Aos que estão com medo, explicam: estão começando os assaltos. Vemos os bandos rondando. Entramos no saguão onde vamos ficar o dia inteiro, prontos para sair cada vez que começar novo tremor. São muitos, mas felizmente todos mais fracos.
Aos poucos, cada um enfrenta o medo, volta ao quarto, pega algumas coisas, muda a roupa, faz seu kit de sobrevivência que passa a carregar pra todo lado desde então -documentos, carteira, uma muda de roupa básica, telefones celulares, óculos.
Só o que se quer então é falar com a família, dar notícias. A comunicação é muito precária. Acesso intermitente a televisão. Telefones, internet e celulares não funcionam. Quem tem blackberry compartilha com todos, quem consegue falar com o Brasil pede para dar recado aos parentes dos outros.
Durante todo esse primeiro dia é assim. Estreita-se uma rede de solidariedade e sentido de equipe.
Eu deveria ir para o aeroporto duas horas depois, voltando para casa. Mas logo se constata que vai ser impossível que esteja aberto. Até agora não se sabe ao certo quando abrirá. Tudo é incerto e precário. Mas lembro de meu pai, quando eu era criança: eu devia era rezar para o meu anjo da guarda e agradecer. Estou bem, entre amigos, não aconteceu nada a nenhum de nós. Triste consolo, em meio a um país desolado, atingido pela dor.